EPISÓDIO 1.06
"DESLIZE FATAL"
FADE IN.
CENA 01/AVENIDA DESERTA/ CARRO ROSA/
INTERIOR/ MANHÃ.
Uma mão masculina toca o retrovisor interno de um
carro e vira para si: trata-se de Eduardo, visto do espelho. Com um batom em
mãos, retoca os lábios; pisca os olhos para o espelho e liga o rádio do carro.
Eduardo, com uma expressão de preocupação no rosto, coloca
a cabeça para fora do veículo e encara uma estrada de terra e algumas árvores.
Eduardo
(incomodado): Tô mais perdido que o sucesso de Psicose!
Coloca
as mãos na volante e acelera o veiculo, percorrendo a estrada, precária. Eduardo
avista dois homens, caminhando logo à frente.
Eduardo (aliviado): Minha nossa
senhora das bigodudas desesperadas, estou a salvo e ainda tenho dois bofes aos
meus pés.
Eduardo acelera o carro e para ao lado de dois indivíduos, morenos, altos e
carecas, vestindo camisas pretas pouco rasgadas e calça jeans. Ambos se
inclinam e olham para Eduardo através da janela direita.
Eduardo (dentro do carro): Querido,
estou atrasado para entrevistar o meu chefe, Félix Crítica. Conhece? Não, né? A
primeira entrevista em holograma do Brasil... Então, pode me dizer onde estou?
(pausa) É que, normalmente, peço para o Idalécio me buscar no meu belíssimo
palacete, mas aquele lá pediu demissão para ajudar o Gustavo Xavier Negreiros,
na segunda temporada de Psicose, vê se pode?
Eduardo leva as mãos na janela, fazendo movimentos com os dedos, em direção a
calça de um dos homens.
Sonoplastia se encerra.
Eduardo (malicioso): Podemos brincar
um pouquinho, quando você me leva para o prédio da TVV.
Um dos homens ri, saca um calibre 38, aponta para a cabeça de Eduardo. Ambos
dão a volta no carro e param frente a porta de Eduardo.
Homem #1 (berra): Vaza do carro bichinha!
Anda!
O outro homem abre a porta e puxa o entrevistador, jogando-o no chão.
Homem #2: Sou seu fã cara, mas temos
que sair desse lugar, ou iremos morrer!
Os dois homens entram no veículo rosa e o aceleram. Em poucos segundos, o
automóvel some pela estrada deserta.
Eduardo: Nunca fui tão humilhada em
toda a minha vida!
Os olhos do entrevistador ficam vermelhos. Eduardo começa a caminhar pela estrada,
olhando para os lados, perdido. Até que ele põe as mãos sobre o bolso da calça.
Eduardo: Já tinha me esquecido...
(Retira o aparelho celular do bolso; encara) A TIM ta sem sinal, meu senhor
Jesus! Yuri bem que avisou para não mudar de operadora. E agora? O que será de
mim? (T; encara a CAM) Pelo menos, logo, logo, o Luiz Gustavo irá mandar toda a
alta cúpula atrás de mim!
CENA 02/MANSÃO AMARAL/ SALA
PRINCIPAL/ INTERIOR/ MANHÃ.
Yuri coloca, sobre a mesa de centro, uma vasilha cheia de pipoca, acomodando-se
no estofado. Pega o controle rosado do chão e liga o aparelho de televisão, de
42 polegadas.
Yuri (descansado): Já fiz de tudo
nessa casa. Limpei o chão, fiz a feijoada, arrumei a cozinha, agora vou me acomodar
e ver Faça suas apostas. Amando de paixão a Sheila.
O telefone toca diversas vezes.
Yuri: Povo chato, só pensa em
telefonar quando o divo soberano não está, mas vou fazer a rainha...
Yuri aponta o controle para a televisão, acionando o botão de pause, que
congela a programação.
Yuri: Minha linda está entrevistando
o Félix, então, não vejo nada demais em tirar o telefone do gancho, pra ver
minha novelinha.
Yuri puxa os fios do aparelho e retorna ao estofado, colocando algumas
almofadas sobre o colo.
Yuri: Surpreenda-me, Gabriel!
Yuri aponta, novamente, o controle para a TV e a cena descongela.
CENA 03/AVENIDA DESERTA/ MANHÃ.
A CAM foca no salto alto brilhante em meio a uma estrada deserta. Eduardo
continua com o celular próximo ao ouvido.
Eduardo (irritado): Yuri, seu
desgraçado! Cadê você, que não atende meus telefonemas?
Eduardo joga o aparelho celular no chão e pisa em cima.
Eduardo (grita): Desgraçado!
CENA 04/ EMISSORA TVV/ INTERIOR/ RECEPÇÃO/
TARDE.
Rosinha, atrás do balcão, desliga o telefone com uma expressão de felicidade e
avista o relógio, que marca o horário exato, 14h35min.
Rosinha: É hoje que vamos fazer uma festa!
O elevador é aberto. Dele saem Walter Hugo, William Araújo e Emerson Faria.
Walter Hugo: O que está havendo?
Rosinha (em off – ligando o som): O Eduardo não apareceu até agora, vamos
sambar, queridinhos.
William olha para Emerson.
Emerson: E o Félix? Luiz?
William: Não podemos
farrear assim!
Rosinha liga o aparelho sonoro, colocando um funk pesado.
Rosinha (comemora): Ninguém está na
emissora, amados, vamos até o chão livres, leves e soltos!
LEGENDA: MINUTOS DEPOIS...
Uma grande quantidade de pessoas: assistentes,
atores, autores, dançam ao som de diversas músicas.
Rosinha (levanta a taça): Um dia sem
o Eduardo!
Todos erguem as mãos e brindam com as taças de cristal, um ao outro.
O toque do elevador é escutado. Rosinha desliga o aparelho e todos olham para a
porta, que se abre. O robô Félix entra no cômodo ao lado de Marcelina e param,
adiante da multidão.
Félix: O que está acontecendo aqui?
Rosinha se aproxima do patrão.
Rosinha: É que a TVV, é uma emissora
unida, patrãozinho. Estávamos, apenas, celebrando (levanta o tom de voz) a não
vinda do Eduardo Amaral para cá!
Todos atrás gritam em tom de comemoração.
Félix: E porque parou a música?
Vamos descer o morro e mostrar ao Eduardo, como se faz uma festa de verdade!
Rosinha liga o som e todos voltam a dançar.
CENA 05/ AVENIDA DESERTA/ TARDE.
Um ônibus passa em meio à avenida deserta, levantando a poeira. Logo atrás, Eduardo,
gritando, sai correndo em direção ao veículo. Sobe os degraus e se mostra
irreconhecível: suado, molhado, sujo pela poeira.
Eduardo: Calma querido, ta dirigindo
para algum filme dos velozes e furiosos? Já não tá vendo meu estado?
Motorista:
Entra logo, bichinha!
Eduardo: Você sabe com quem está
falando?
Motorista: Com um viado que está
atrapalhando meu serviço. Agora vá para o fundo!
Eduardo passa pela a catraca e caminha pelo o ônibus, completamente lotado,
quando esbarra em um homem loiro, sem camisa, sarado.
Eduardo: Oi, gato. (fingi mastigar
chiclete) Tudo bem contigo? Podemos ir, juntos, para a academia em?! Você me
joga naquela bicicletinha e eu saio lizinha.
Homem
sarado: Se olhe no espelho, travesti.
O homem vai para frente do veículo. Minutos depois, desce. Eduardo encara seus
movimentos.
Eduardo: Grosso.
Eduardo acomoda-se num banco, ao lado de uma mulher, negra, de cabelos compridos
e um pouco acima do peso.
Eduardo: Oh, gorila mutante... A
senhora tem quantas bundas? Chega pra lá. Tá ocupando dois bancos. (pausa)
Cuidado, que com um rabo grande desses, macho nenhum vai querer.
Eduardo encara a mulher.
Gorila Mutante: Vários homens estão me querendo. Sou linda, gostosa,
maravilhosa, beijinho no ombro, para a poeira do seu corpo passar longe. Todos
estão caindo aos pés de Joaninha Unha de Cana, meu bem!
Eduardo:
Caindo de medo, né? (ri; berra). Motorista, vai mais rápido, parece que ta
dirigindo uma tartaruga.
Motorista (em off – dirigindo): Eu
estou no limite máximo, se eu passar disso, levo uma multa.
Eduardo:
Povo tudo fedido. (abana o corpo com as mãos) Essa gente, parece que nunca
ouviu falar em desodorante. E você, gorila mutante? (volta a encarar a mulher) Nunca
pensou em usar um papel higiênico depois que faz as necessidades?
Joaninha se levanta, nervosa, coloca as mãos na cintura.
Joaninha: Escuta aqui, querido, tenho
cara de trocha? Acha que eu vou ouvir você me ofender e vou ficar quieta! (T)
Vai apanhar, viadinho playboy!
Joaninha empurra Eduardo no chão, fazendo uma
multidão gritar, comemorando. A mulher se senta em cima da barriga do
apresentador e deferi vários tapas e murros.
CENA 06/ EMISSORA TVV/ INTERIOR/ RECEPÇÃO/
TARDE.
Todos se divertem ao som da música. Quando o elevador é acionado. Luiz Gustavo,
usando terno caminha sobre a multidão e joga o aparelho sonoro no chão, fazendo
com que todos o olhem. Luiz permanece enfurecido.
Luiz: Posso saber o que está acontecendo por aqui?
O robô desliza sobre o chão e encara o rapaz.
Luiz: Você está louco, Félix?
Transforma a emissora em um piscinão de ramos?
Félix:
Todos estão comemorando a ausência do Eduardo...
Luiz encara cada um, trêmulos, Ele estala os dedos, fazendo com que todos voltassem
ao trabalho.
Luiz (preocupado): Ele não veio por
qual motivo? Tiramos o Eduardo da calçada, fazemos um rombo nos cofres da TVV a
cada mês e ele não vem? Alguma coisa está errada.
Luiz caminha até Rosinha, que ajeita os objetos da recepção, ignorados durante
a comemoração.
Luiz: Trate de descobrir, onde está
o Eduardo Amaral, Rosinha.
Rosinha:
Sim, senhor.
CENA
06/ EMISSORA TVV/ INTERIOR/ CORREDORES/ TARDE.
Luiz caminha pelos os corredores, seguido por Félix.
Félix:
Está preocupado com este garoto de programa?
Luiz:
Claro, Félix! É nosso funcionário, como qualquer outro.
CENA 07/ ÔNIBUS/ INTERIOR/ TARDE.
Uma multidão grita “EDUARDO, EDUARDO, EDUARDO”, diversas vezes seguidas. O
entrevistador mantém o controle da briga e começa a esmurrar Joaninha Unha de
Cana.
Eduardo (ofegante): O Brasil me ama,
queridinha! Ta pensando o quê?
Eduardo se levanta, deixando a mulher no chão exausta.
Eduardo (grita): Eu venci!
As pessoas vão para cima, abraça-lo, mas o mesmo recua.
Eduardo: Sai, que eu ainda odeio
pobre.
Motorista
(em
off – dirigindo): Meu Deus. Oh, não!
PLANO GERAL DA AVENIDA: o ônibus, em uma ultrapassagem, perde o controle em
meio da pista, indo contra um caminhão.