Capítulo 39: Eu deixei você cair
Wagner e
Pedro, como tudo começou...
O discurso de Dupré
terminou com lágrimas dele e de todos que estavam presentes. Wagner não
conseguiu conter o choro e saiu do velório correndo. Sem olhar para o nada e
sem enxergar ninguém, o adolescente acabou esbarrando em um convidado, um
adolescente como ele, já na saída.
–Me desculpa. –Pediu Wagner, aos prantos.
–Preciso ir.
–Ei, calma aí cara. –Pedro estendeu seus
braços e acolheu o jovem assustado neles. –Vou te tirar daqui.
–Por que tudo tem que ser tão complicado e
injusto? Ela tinha tanto o que viver, eu a amava tanto...
–Infelizmente a vida não tem explicação.
A cura de lágrimas acompanhada de afeto e compreensão...
Bem longe de casa e
acompanhado de um rapaz belo, Wagner pode espairecer um pouco e “esquecer” os
acontecimentos dos últimos dias. Sentado na beira da cama de Pedro, Wagner
observou as paredes do rapaz, repletas de molduras em preto e branco de fotos
suas e de sua família, de quando ele era criança. Ambos de mãos dadas na praia,
em parques temáticos... Em todas as fotografias um sorriso imenso habitava o
rosto daqueles que faziam elas. Ver aquelas fotos fez com que lágrimas
brotassem nos olhos de Wagner.
–Tem algo de errado? –Indagou Pedro,
preocupado.
–Por que me trouxe até a sua casa? Nem me
conhece... –Disse Wagner. –As pessoas não trazem estranhos até seu quarto, se
for me matar faça logo.
–Não seja bobo. Eu não sou qualquer pessoa,
meu sentimentalismo faz com que eu me preocupe até com quem eu não conheço, e
você estava em prantos no velório da sua avó.
–Ela era a pessoa mais importante da minha
vida, difícil não estar em prantos.
–Onde você vai passar o natal e o réveillon?
–Em casa... Por quê?
–Meus pais e eu iremos celebrar no Rio de
Janeiro, a queima de fogos na praia de Copacabana é divina, poderia vir com
agente.
–Prometi a minha namorada que daria atenção a
ela depois que tudo isso passasse.
–Se mudar de ideia, meu convite ainda está de
pé.
–Obrigado.
–Agradeça aceitando o meu convite.
O amor que crescia no coração de ambos se tornava forte demais para ser
separado...
Após encostar o
celular no ouvido esquerdo e ouvir a voz grossa de Pedro, Wagner se esqueceu de
toda a magia que Isabella havia lhe transmitido ao chegar à mansão. Havia algo
naquele rapaz que lhe encantava de uma maneira diferente, mas como ele poderia
contar a alguém sobre aquela sensação? Sua avó, que naturalmente lhe entenderia
e lhe diria o que fazer estava morta, então ele resolveu apenas atender e
esquecer tudo aquilo.
–Faltam duas semanas para o Natal e você não
me ligou então resolvi ligar. –Disse Pedro, aparentando estar sorrindo do outro
lado da linha pelo tom de voz adocicado. –Fiz mal?
–Não... –Respondeu Wagner. –Na verdade fez
bem. Desculpe por esquecer, é que...
–Não precisa explicar, eu sei das coisas que
andam acontecendo com você nesses últimos dias.
–Obrigado por entender.
–Mais e então, você vai vir comigo e meus pais
para o Rio de Janeiro?
–Minha namorada acabou de chegar de Curitiba.
–Ainda temos duas semanas, poderá curtir ela
até viajarmos... Só, por favor, não diga não.
–É tão importante para você que eu vá?
–Muito mais do que você imagina.
–Nesse caso, prometo pensar com carinho.
–Pense. E por favor, não diga não.
–Não direi...
Sexo é consequência...
Em baixo do chuveiro,
Wagner e Pedro se amavam incondicionalmente. O que eles faziam, parecia tão
proibido e tão bonito, que a cada movimento, a vontade de continuar o ato se
tornava mais forte. Ambos exploravam seus corpos de uma maneira tão “suja” ao
modo de ver pela sociedade. O toque de ambas as mãos foi muito mais além do que
imaginavam. A água quente que caía do chuveiro, apenas contribuiu para tornar
tudo mais perfeito. E em um momento de transe, Wagner disse a Pedro,
silenciosamente:
–Eu te amo, espero que quando acordamos no dia
seguinte, você possa me perdoar.
E o dia seguinte jamais existiu...
A água quente caiu sobre o corpo molhe de Wagner
e se misturou com as lágrimas que escorriam de seus olhos. Na mente do rapaz,
imagens de momentos felizes ao lado de Pedro começaram a passar como um filme. Aquilo
tudo que estava acontecendo parecia um pesadelo e o que ele mais queria, era
acordar. O vapor tomou conta do banheiro. Assim como o box de vidro, o espelho
estava todo embaçado. Wagner saiu debaixo da água quente, pegou uns calmantes
dentro do armário e mergulhou em um sonho profundo e eterno, do qual nunca mais
acordaria... [...]
Ambulâncias e viaturas policiais cercavam a
mansão dos Gouveia. Os noticiários locais só falavam sobre aquele terrível
suicídio. Wagner havia sido encontrado morto dentro de sua banheira por seu
pai. Toda a família estava desesperada com o acontecido e uma polêmica havia
surgido: “O adolescente era gay.”.
–A culpa disso tudo é sua Silvana! –Exclamou Pedro aos prantos. –Você
matou o seu próprio filho com toda aquela perseguição maldita! Está satisfeita?
Agora a senhora não tem mais um filho gay, na verdade a senhora nem se quer tem
um filho.
Os paparazzis
fotografaram a discussão entre Pedro e Silvana, que estampou tabloides
internacionais no dia seguinte. Além de toda a polêmica sobre homossexualidade,
estava a gravidez de Isabella, que também havia sido jogada na direção dos
jornalistas. Enquanto todos a culpavam e a xingavam, Silvana se trancou no
quarto do filho. O remorso a destruiu por dentro, corroendo todos os seus
sentimentos. Naquele instante, ela pensou em cometer suicídio também, mas de
nada resolveria, por que seu filho não retornaria a vida. E era o que Silvana
mais queria naquele momento. Seu filho de volta.
–A culpa é minha. –Ela cedeu aos xingamentos e
todas aquelas pressões, caindo de bruços sobre o tapete do quarto de Wagner
para derramar todas as lágrimas acumuladas. –Me perdoa Wagner! Por favor meu
amor! Eu te amo.
João Pedro, que
passava no corredor naquele instante, entrou no quarto do filho e disse a
Silvana:
–Precisamos escolher a roupa que enterraremos
nosso filho. Quanto mais isso acabar, menos iremos sofrer.
–Não sei se eu consigo... –Sussurrou Silvana.
–Você precisa.
Manhã seguinte...
Tanta tragédia em tão
pouco tempo havia acontecido no antro daquela mansão. E todas essas tragédias
envolvem Sônia, a herdeira perdida. Ela estava cansada do título de nova
Helena, ela estava cansada de ser tratada como Esther. Todas as boas maneiras
que ela havia aprendido em tão pouco tempo sucumbiram junto com a vida de
Wagner. Aquele rapaz significava tanto para ela quanto seu filho que estava
para nascer.
–Eu sinto como se ele gritasse por ajuda e
ninguém pudesse ajuda-lo. –Ela estava se despindo. –Não quero ir ao velório...
–Você precisa querida. –Disse Lúcio.
–O que vai ser dessa criança que a Bella está
esperando?
–Eu não sei...
–E o nosso casamento? Como podemos pensar no
nosso casamento em meio a tanta tragédia?
–Daremos um jeito.
–Eu não aguento mais Lúcio... Eu não aguento
mais. Só aconteceu desgraça nessa família desde que eu me tornei herdeira. As
vezes eu acho que eu deveria ter ouvido minha mãe. Seria melhor.
–Se você tivesse ouvido ela, nós não
estaríamos juntos agora.
–Esse filho nem se quer é seu...
–Nunca mais repita isso Sônia!
Lúcio abraçou a noiva
nua em um impulso só. Ele passou a ela segurança. Uma segurança que havia ido
embora há muito tempo, e naquele instante Soninha percebeu que tinha alguém
para amar e que aquele filho que ela carregava realmente era de Lúcio e de mais
ninguém. Finalmente João Pedro não significava mais nada a ela.
–Me perdoa amor... Me perdoa. –Implorou
Soninha ao noivo.
Dezenas de amigos
gays de Wagner compareceram ao velório. O pranto de todos estava mais do que
visível. Silvana os observava de longe por cima do óculos escuro. De alguma
maneira tê-los por perto trazia seu filho gay de volta. O caixão era baixado e
enquanto ele baixava, Pedro leu algumas palavras ao amado:
Já vi o mundo, fiz de tudo
Tive meu pedaço do bolo agora
Diamantes, brilhantes
E Bel-Air agora
Noites quentes de verão no meio de julho
Quando você e eu éramos eternamente loucos
Os dias enlouquecidos, as luzes da cidade
A maneira como você brincava comigo como uma criança
Você ainda me amará
Quando eu não for mais jovem e bela?
Você ainda me amará
Quando eu não tiver nada além de uma alma que dói?
Sei que você irá, sei que você irá
Sei que você irá
Você ainda me amará
Quando eu não for mais bela?
Querido Senhor, quando eu for
para o céu
Por favor, deixe-me levar meu homem
Quando ele chegar, diga-me que Você o deixará
entrar
Pai, diga-me se puder
Oh, aquela graça, oh, aquele corpo
Oh, aquele rosto, me faz querer festejar
Ele é meu sol, ele me faz brilhar como diamantes
Lana del Rey (Young and
Beautiful)