II
Passaram algumas aulas, muitos deveres de casa, etc, etc...
Mas eu prometi que não teria mais blá, blá , blá. Não prometi? E eu não sou
mentirosa não. Lá vamos nós ao bendito dia do ensaio. O que eu gostaria de
dizer é que em algum lugar tocava uma música qualquer da Celine Dion, como
música de fundo sabe? Mas não teve nada disso.
O pessoal já estava ensaiando e eu estava sentada brincando
em mexer os pés. Foi aí que ele chegou. Cabelos muito pretos, alto, nem forte
demais nem magro demais, absolutamente na medida. Não dava para dizer a cor dos
olhos ao certo, mas o efeito que a luz do sol produzia ao encontrá-los,
ah...isso era mais indescritível ainda. Sabe, eu acredito que as pessoas já
nascem com algum talento natural. Uns são incrivelmente aptos para aprender,
inteligentes, outros têm aquele poder de liderança como se cada palavra dita
soasse como um convincente siga-me e ainda tinham os como aquele ali. Tudo, eu
disse T U D O que ele fazia parecia charmoso e incrivelmente bonito. Fiquei
imaginando ele acordando com o cabelo sujo e bagunçado com um bafo de boca de
defunto, e um cheiro azedo de suor...Incrível! Seria lindo e sexy do mesmo
jeito!
Ele cumprimentou uns e outros que encontrou no trajeto, com
um simples e completamente encantador: E aí?. E veio em sua direção.O que eu
estava fazendo de errado para ele me notar? Peraí... Para... Para... Para. Ele
era seu par? Ele era seu par! É isso aí meu tio, a sorte está sorrindo para
mim.
[Dancinha mental da vitória...]
Pronto, você já está contente? É porque depois ele deu um
abraço e um aperto na bunda da outra menina que estava sem par, aquela com
muito no peito e... Você sabe, ele era namorado dela.
Ibope divulga pesquisas: Chances de ele largar a namorada e
ficar comigo apaixonadamente à menos 5% (podendo variar para mais ou para
menos).
OK, eles ficaram lá se beijando e tals. Eu sorri e tratei de
olhar para qualquer outro lugar. Depois de um cinco minutos o meu par
chegou...Eu não poderia ser muito exigente mesmo...
Pedro Rômulo era um menino que crescera mais que a média,
seu jeito totalmente atrapalhado e seus óculos com durex no apoio da orelha não
contribuíam para opor a ideia de que ele tinha algum distúrbio mental.
Oi...Você que vai dançar comigo? Ele se aproximou de mim e
sentou ao meu lado, ainda ficando numa posição bem mais alta que a minha.
Eu mesma, em carne, muita carne, alguns ossos e pés
desastrosos Tentei ser amigável,como você pode ver.
Ah... Meu nome é Pedro - Ele disse, rindo.
Helena e eu nos cumprimentamos.
Tâmara e Jorge discutiam num canto,
ele já tinha dado sete pisadas no pé dela... e a música nem tinha tocado ainda.
(...)
Depois
que eu conheci o tal Pedro Rômulo comecei a notá-lo na aula. Ele sentava bem
curvado na última cadeira da fila do canto, como se tentasse ficar camuflado.
Achei isso meio que parecido com minha própria situação. Eu, Tâmara e Jorge
debatíamos a respeito de um professor asqueroso de geografia. É engraçado,
prazer de aluno é falar mal de professor e a verdade é recíproca. Eu li uma
vez, em algum lugar, que geografia é a matéria mais estranha que existe. Parece
ser a mesma desde a quinta série e você ainda não aprendeu. Eu concordo. Droga,
já estou enrolando de novo, desculpe. Não é de propósito é que eu sou meio
tagarela. Sim, sim, você já percebeu. Claro! Vamos aos fatos:
Fato
1) Percebi que se eu estava desconfortável com isso de dançar o Pedro estava
angustiado, irrequieto, preocupado elevado a quarta potência.
Fato
2) Além de muito estranho, e com cheiro de queijo provolone, ele era
estranhamente gentil.
Fato
3) Eu preciso estudar matemática, sério. Tipo urgente.
Eu ainda
não o descrevi muito bem fisicamente. Vamos nessa: Como eu já disse mais alto
que o normal isso seria de 1,9 alguma coisa ou 2 m . Tinha um cabelo
avermelhado, não era bem ruivo, era uma mistura. Usava por cima da farda um
casaco azul largo demais para sua magreza.
Esse
momento é fundamental. Permita-me.
[risos]
– respiração corrida – [risos] – respirando fundo.
Pronto.
O que
é tão engraçado? É que eu sei exatamente
o que você está pensando. Eu vou explicar, mas antes vou resumir tudo numa
onomatopeia e numa descrição curta, veja : “huumm...” sorrisinho de canto de
boca. Ah, querida e pacata pessoa, você está aí com seus miolos imaginando uma
cena de romance, não está? Farejando com os olhos um entendimento entre mim e
Pedro, uns beijinhos... Eu sabia...
Mas não vai acontecer. Provavelmente estou
arruinando a história – que já não é grande coisa – contudo, eu tenho que fazer
o papel daquela pessoa detestável que com um riso enfiado numa cara de desdém
fala “eu avisei”. E fiz mesmo, eu disse inúmeras vezes que o que eu estou
contando não é o que você costuma ler. Ou vai ver não é o que você quer ler. Sinto muito. Quer saber o que eu
penso? Acho que quando lemos uma história nós nos “escrevemos” também, é como
se nos colocássemos no lugar das personagens, e queremos que aconteça com elas
o que queríamos que acontecesse conosco. Porém, quantas vezes – principalmente
nós, garotas – imaginamos cenas, ações, situações... Fala sério, você nunca
ensaiou aquele diálogo – ou melhor, monólogo- no espelho do banheiro? E ouvindo
aquela música antes de dormir? E quantas vezes o que você imaginou realmente aconteceu? Pois é, raramente. Infelizmente.
Não vou iludir você, e não estou dizendo que isso seja bom. Apenas conto os
fatos... Os fatos! Enrolando de novo.