I
Eu
poderia contar uma história linda, com pessoas extraordinariamente bonitas,
vidas perfeitas. Seria mais ou menos assim: Uma menina excepcionalmente bonita,
um rapaz igualmente bonito, educado e gentil. Um conflito, pazes, tudo está bem
quando termina bem, certo?
Não.
A
sua vida não é assim, a minha também não. A de ninguém é. Não existem estradas
perfeitas, o que existem são caminhos menos tortuosos e outros mais
esburacados. A minha vida, que eu contarei para vocês por um tempo, é um
caminho de barro bastante irregular. Talvez você prefira uma outra história,
uma estrada perfeita, lisa, bem iluminada. Vá! Leia essa outra história
deliciosa, sedutora e irreal. Iluda-se!
Mas
eu vou seguir contando o que me aconteceu para quem quiser saber. E sem mais
enrolação, que eu não vim aqui para isso.
Tudo
começou em 16 de Maio de 1994, bem, nesse dia Rosa Lumier foi à clínica São
Luís junto com seu marido Paulo Lumier. Enfim, eu nasci, mas não é realmente do
início que eu quero começar. Basta dizer que meu nome é Helena, mas tenho o
estranho apelido de Pupa, sem maiores explicações para isso. Morava com meus
pais numa cidade pequena, alguns amigos, gosto de ler boas histórias, ver bons
filmes.Detesto números, sempre me ferrei nas três irmãs más: Matemática, Física
e Química. Fisicamente nunca fui grande coisa, uns quilinhos a mais...Certo,
muitos a mais. Olhos de cores normais, nada de azul ou verde, só um castanho
básico. Cabelo normal, nada daqueles belíssimos de propaganda de xampu. Aliás,
é preciso um grande esforço para mantê-lo no lugar, se um dia você me vir por
aí com o cabelo bagunçado pense que eu ralei para chegar no que agora você está
chamando de “bagunçado”.
Meu
pai recebeu uma boa proposta para trabalhar num grande jornal de uma grande
cidade. Minha mãe conseguiu transferência , corretores de imóvel são
necessários em todos os lugares. E eu? Bem eu ia entrar no meio do ano numa
escola enorme, onde certamente eu não conhecia ninguém. Pensei em todas as
possibilidades de tudo dar errado. Errado. Certo. Não sei. Na real, eu penso
que não existe isso de 100% certo ou errado, como também não existe algo
absolutamente bom ou ruim. O mundo não é feito de coisas exatas, é mais uma
mistura. Eu vou lhe dizer como os fatos seguiram, e caberá a você julgar se o
saldo foi positivo ou negativo.
(...)
Primeiro dia na escola nova, eu fiquei repassando todo um
esquema mental para não cometer nenhum deslize. O que se tratando de mim era
tecnicamente impossível. Devo admitir ainda que fiquei muito nervosa, o que já
estava previsto. Fiquei contente pelo uso de uniforme ser obrigatório, assim
não tinha como eu escolher a roupa errada. Meu pai queria chegar cedo ao
trabalho no seu primeiro dia e por consequência eu cheguei cedo também, pedi
umas orientações na frente da escola. Cheguei a minha sala, tinham só umas três
pessoas.Murmurei um bom dia, que não foi respondido, sendo justa ele
provavelmente não foi nem ouvido. Sentei na quarta cadeira do canto. Pus minha
mochila no chão, tirei o celular do bolso e fiquei ouvindo alguma coisa da
Pink.
A aula começou e eu não fui percebida. Só lá pelo quarto
horário a professora de história ficou me encarando... me encarando...
encarando mais um pouquinho...”Você é nova aqui?’’ . Afirmei que sim com a
cabeça. Um milhão de cabeças com seu par de olhos curiosos viraram para mim. Desejei
ser do tamanho de um alfinete e não de um filhotinho de elefante. “Bem vinda”.
“Obrigada” . Tentei sorrir, mas quando tento sorrir sem real vontade de fazê-lo
sempre sai uma cara de idiota. No intervalo uma garota com óculos de armação
marrom e aparelho nos dentes veio até mim.
– Então você é novata?
– Sim
– Qual o seu nome?
– Helena. E o seu?
– Tâmara, seja bem vinda
– Valeu Tâmara
Aí chegou a hora da saída, me despedi da Tâmara – parecia
ser bem legal, ainda bem que eu já tinha com quem falar no intervalo – fui
descendo as escada que por sinal estavam entupidas de gente.
Os dias seguintes foram parecidos com o primeiro, depois de
uns 3 meses eu e a Tâmara ficamos amigas. Ela também era amiga de um menino de
penteado estranho chamado Jorge, que acabou se tornando meu amigo também.
Tirando isso continuei sendo parcialmente ignorada pelo resto da sala, o que
era relativamente bom. Mas essa ladainha toda não lhe interessa, não é mesmo?
É,é, eu sei, mas tenho que dizer para que você entenda o que vem por aí. Ah, o
que? O que você disse? Hum, sim você quer saber o que vem por aí, naturalmente.
Vem o mês de Outubro e a gincana do colégio. Seu colégio
também faz gincana? O meu antigo não fazia. Esse colégio não só fazia como era
uma gincana ultra,mega,hiper sofisticada. Tinha carreata, briga entre as turmas
, um zilhão de danças e tudo. Inclusive era obrigatória que todos os alunos
participassem de pelo menos uma dança. O QUE? Eu + dança = conjunto vazio . A
líder da nossa turma, obviamente uma dessas meninas com muito no peito e pouco
no cérebro, disse que a organização ia ser democraticamente por altura. Mas é
claro que os grupinhos não foram desfeitos, acabou que eu fiquei sem par, a
Tâmara sempre ia com o Jorge.
Eu pensei “Uhu pelo menos eu não danço!” . OK, isso não
mudava o fato de eu ter ficado excluída, mas tudo tem um lado bom, eu já tinha
quase me auto-consolado quando me falaram que uns garotos ainda faltavam, dois
mais precisamente, aliás uma das GMLS (Garotas Mais Lindas da Sala) também
estava sem par. Óbvio que ela não tinha sobrado como eu, um dos caras que
faltava era o namorado dela. Enfim, no próximo ensaio eles viriam. E aí... aí a
história realmente começa a ficar mais interessante e
menos burocrática. Porque vamos acertar, como você leu até aqui? Isso aqui está
muito chato. Mas vai mudar, eu garanto.