EPÍLOGO
Um ano depois...
-
Você esqueceu-se de mim novamente, não é? – perguntou Lex, lançando um olhar de
reprovação quando sua amiga Janaira desembarcou do helicóptero.
-
É muito bom ver você também, querida amiga! – falou Janaira, num tom irônico,
mas as duas se abraçaram por alguns minutos. – Estava morrendo de saudade.
-
Quinze dias! Está passando cada vez mais tempo na fortaleza.
-
O “Senhor da Fortaleza” exige a minha presença, o que posso fazer? – comentou
Janaira, divertida.
-
É isso ou é o fato de você estar cada vez mais apaixonada pelo “Senhor da
Fortaleza”? – implicou Lex, com um sorriso.
-
Daniel tem sido um bom amigo. Ele perdeu a esposa. Eu perdi Casper. Acho que
nos entendemos. Somos um bálsamo um para o outro. Mas estamos indo com calma,
caso pense algo diferente. Nós nunca ficamos juntos. É que realmente ele tem
dificuldade em organizar tudo na fortaleza e precisa de mim. Há tantos desafios.
Sabia que tivemos o primeiro nascimento desde o apocalipse? Uma menina linda
chamada, adivinhe, Alexia Bittencourt. O casal é muito fofinho. A mãe, Sarah
estava no supermercado. O pai, Donato, foi transformado em zumbi durante a
invasão da fortaleza. Quando eles se reencontraram, enquanto nós ainda
estávamos no casarão, resolveram que precisavam ter um bebê. A história é
linda. Eu chorei muito quando a escutei. Queria que Casper estivesse aqui.
Seria lindo ter um bebê dele.
Janaira
ficou triste. Ela ainda sentia a falta de Casper. Não conseguia esquecê-lo,
embora Daniel Dantas estivesse sendo uma companhia muito agradável a ela.
-
Muito linda a história, mas ainda não explica porque você esqueceu do meu
carregamento. – exigiu Lex.
-
Não é fácil ser a chefe da logística, Lex. Muitas demandas e você sabe que o
chefe mandou dar prioridade para Melanie e Lanister. O hospital e o laboratório
estão de vento em popa.
-
Claro! E se tivermos um ataque surpresa de zumbis na nossa porta, Janaira? Como
é que vamos conter um pequeno exército. Com pedras e paus? Minha reserva de
armamento está uma piada!
-
Já fizemos isso antes, espertinha! – provocou Janaira, mostrando uma caixa de
papelão na mão. – E isso era mais importante do que suas balas e granadas,
Rambo!
-
O que é isso? – Lex perguntou curiosa.
-
É pro seu pai! São amostras. Os testes com os voluntários foram um sucesso,
Lex. A cura é definitiva agora! Você não ser mais um saco de sangue ambulante.
Ele fez isso por você! Você deveria ser mais grata, amiga! Ele é a única
família que você tem agora!
Lex
baixou a cabeça. A morte de Lizzie ainda a assombrava. Lex nunca imaginou que Lizzie iria morrer.
Mas sua pneumonia foi se tornando cada vez mais agressiva. Depois de alguns
meses e diversas paradas respiratórias depois, sua irmãzinha não resistiu. Lex achou que iria morrer, então, a dor foi
diminuindo. A vida continua. É dura, é difícil, mas continua e é preciso achar
uma forma para continuar. E Lex havia achado a forma em seu trabalho e havia
muito trabalho a se fazer.
-
Sinto muito, Lex. Sei que não gosta de lembrar da Lizzie. – disse Janaira,
envolvendo Lex em seus braços. Janaira era uma boa amiga. Era sua melhor amiga.
Havia perdido sua irmã, mas havia ganhado outra - Só estou querendo dizer que
Lanister é sua família agora e ele está tentando de verdade chegar até você.
Você é que é arredia. Leva isso pra ele. Acho que ele vai querer contar os
detalhes pra você.
Lex
entrou no Orgão Central e desceu os elevadores. Agora, o laboratório de
Lanister era no 24º andar. E o 25º, 26º e 27º eram todos dedicados ao hospital
que abrigava pessoas que necessitavam de atenção médica, não zumbis. Todos os
experimentos com zumbis eram realizados na Fortaleza sob a monitoria de Bio.
-
Lex!!! – berrou Lanister animado assim que ela desceu dos elevadores. – Trouxe
meu pacote?
Ela
entregou para ele e Lanister rasgou o papelão como se abrisse um presente na
manhã de natal. Desde o dia da libertação da Cidadela, Lanister havia se
transformado num novo homem. Parecia cada dia mais consciente, mais centrado.
Sua sanidade havia retornado aos poucos.
-
Sabe o que é isso? – disse ele, mostrando-lhe uma ampola.
-
Janaira me contou por cima. É uma cura definitiva, não é?
-
É mais do que isso. Aumenta a retroatividade de 48 horas para 5 até 7 dias.
Isso quer dizer que mesmo que você seja infectado há mais dias, ainda há uma
esperança de curá-lo definitivamente e eu quero fazer mais, Lex. Quero chegar a
uma retroatividade infinita, salvar todos os zumbis que você salvou. Isso pode
trazer todos de volta, até os que já se transformaram há mais de um ano atrás.
Quem sabe um dia, eu possa trazer seu pai Teddy de volta. Isso seria bom, não
é, não é, Lex?
-
Isso seria ótimo! – falou Lex, dando um beijo na bochecha de Lanister. – Assim
eu terei dois pais de volta!
Lanister
piscou repetidamente depois de alguns segundos absorvendo o que Lex havia dito.
Janaira tinha razão. Lanister queria ser seu pai e já o fora. Porque ela
insistia em mantê-lo afastado? Ele era a única família que lhe restara.
-
O que disse, filha?
-
Eu disse que terei dois pais de volta.... pai!
Lanister
a abraçou e dessa vez Lex deixou-se abraçar. Repousou a cabeça no ombro de
Lanister e deixou que ele acariciasse seus cabelos.
-
Ah, filha... – disse Lanister. Quando Lex ergueu a cabeça para seu pai, viu que
o velho cientista tinha os olhos marejados. Nunca o vira tão feliz!
Lex
passou o dia inteiro no laboratório de Lanister. Ele havia feito mais das balas
adaptadas e Lex precisava muito daqueles pentes de balas, uma vez que Janaira
costumava esquecer de passar na Trevor & Associados para buscar mais
armamento. Depois, subiu para o 10º andar que havia sido modificado para
abrigar um centro de treinamento de agentes. Assim que desceu do elevador,
Abril gritou:
-
Homens sentido!!! Marecha MacNicholsl!!
Todos
os homens e mulheres presentes fizeram uma saudação para Lex que retribuiu da
mesma forma.
-
Descansar! – disse ela, fazendo seus soldados moverem-se imediatamente para a
posição de descanso: as mãos nas costas, as pernas levemente abertas. – Tenho
uma boa notícia para todos, senhores! O chefe nos deu permissão para iniciarmos
a limpeza de Parnaso, uma vez que agora todos os setores da Capital estão
livres da presença de zumbis. Mas Lanister disse que o repelente que nós usamos
não vai segurar os zumbis fora das áreas para sempre. Assim, precisamos
continuar com o processo de limpeza. Há outra notícia muito importante para
todos. Lanister ampliou o efeito da cura para até 7 dias. Isso demonstra que a
decisão sempre questionada de reter os zumbis, ao invés de destruí-los,
mostrou-se acertada uma vez que a retroatividade da cura pode ser aumentada.
Lex
percebeu nos rostos de seus soldados que aquela notícia era mais do que feliz.
Durante o processo de limpeza da Capital, os soldados capturaram mais de
trezentos mil zumbis. A princípio, a mesa de Agentes Especiais havia declinado
à decisão de mantê-los. Muitos cidadãos da Cidadela propuseram que se fizesse
uma grande pilha de zumbis e que se tocasse fogo, destruindo-os para sempre.
Mas Lex resolveu abriga-los num grande galpão da Capital, mantendo a monitoria
virtual, através de câmeras conectadas ao “Painel de Controle” da Cidadela,
chefiado por Danielle Dantas que era responsável pelo setor de Tecnologia e
Comunicação. Assim como Janaira,
Danielle havia sido promovida a General.
Muitas
vezes, Lex sentiu-se insegura diante da decisão de salvar os zumbis. Se os
mortos-vivos fugissem, a missão de limpeza da Capital seria um grande fracasso
e Lex não poderia se manter no cargo que agora ocupava: o de chefe da Segurança
e Marechal. Entretanto, com a ajuda de Lanister, Lex conseguiu manter os zumbis
contidos dentro de um certo perímetro usando uma espécie de repelente para
zumbis, partindo da mesma composição da cura.
Aquilo
surtiu o efeito esperado. Os zumbis nem tentavam fugir. Ficaram letárgicos,
parados, esperando eternamente uma carne fresca e suculenta que nunca viria.
Talvez agora, houvesse alguma esperança para eles.
-
O major Abril e os coronéis Andrei e Souza estão convocados para uma reunião
amanhã às nove no Pavilhão de Eventos para organizarmos os detalhes da nova
missão. Isso quer dizer que vocês não podem exagerar na festa de hoje a
noite... – disse Lex com um meio sorriso. – Daqui a um ano, quando estivermos
festejando a libertação da Cidadela, espero que a festa tenha mais de
quinhentos milhões de pessoas, a quantidade estimada de zumbis, de acordo com
os estudos de John Casper.
Lex
ainda falou algumas palavras de motivação e em seguida saiu, tomando o
elevador. Abril correu para tomar o mesmo condutor.
-
Senhor... Senhora, quero dizer – Abril sempre ficava nervoso na presença de
Lex. A informação do que Lex havia feito durante a libertação da Cidadela há
uma ano atrás ainda ecoava nos corredores e ruas da Cidadela. Isso mantinha as
pessoas afastadas dela. As pessoas tinham medo, respeito. Era ruim por um lado,
mas dava às pessoas a confiança de ela poderia manter todos a salvo se algo de
ruim acontecesse. – Onde vamos manter os zumbis de Parnaso, não podemos manter
todos no galpão da Capital. Já está cheio, não é?
-
Eu tenho pensado nisso. Acho que a resolução mais rápida é encontrarmos um novo
local no perímetro da cidade e instalar a monitoria virtual. Entretanto, não
poderemos fazer isso se as operações de limpeza continuarem. Lanister está
avançando nas pesquisas, mas precisamos ser cautelosos, não é. John Casper está
com um projeto para criarmos um lugar parecido com a Cidadela, sem o órgão
central, os pavilhões, as praças: apenas o muro e alguns postes com câmeras
para monitorarmos os mortos-vivos. É uma ideia interessante, mas isso precisa
ser aprovado pela Mesa dos Agentes Especiais... então... vamos esperar para ver
o que vai acontecer, Abril.
-
Claro, obrigada senhora...
Depois
de sair no seu andar, o 50º, modificado para ser o lar dos agentes especiais,
Lex correu para seu quarto. Estava atrasada. Com certeza, os outros já estavam
indo para a festa.
Lex
abriu o armário. A maioria de suas roupas eram macacões e roupas de agente, mas
agora já se via alguma cor. Depois da Libertação da Cidadela, cada escravo
tornou-se um cidadão e precisava cumprir uma agenda de trabalho. Como havia
muito mais gente na Cidadela do que na Fortaleza e muito mais recursos, logo as
coisas começaram a melhorar. Agora havia uma pequena fabriqueta de tecidos e
roupas no antigo pavilhão 4, junto com uma série de outras fabriquetas. Por
isso, o pavilhão havia sido renomeado de Pavilhão de Fábricas.
Escolheu
um vestido roxo escuro muito delicado, com um ótimo caimento, algo digno de uma
marechal.
Tomou
um bom banho, penteou os cabelos em um coque sóbrio, colocou alguma maquiagem,
produzida na fabriqueta de perfumes e cosméticos, calçou os sapatos novos e
saiu. No saguão do 50º andar, não havia mais ninguém, nem mesmo Janaira que
levava um tempão para se arrumar. Era mais do que óbvio que ela estava
atrasada.
O
bom de estar atrasada é que os elevadores não pararam em nenhum andar e ela
logo se viu no saguão do Órgão Central.
Quando
desceu as escadas do Orgão Central, escutou a música alta e sorriu. As pessoas
se dirigiam para o Pavilhão de Eventos, o antigo pavilhão nº 5. O lugar havia
sido transformado. Estava todo enfeitado e perfumado. No palco montado, havia
uma pequena filarmônica tocando. Surpresa, Lex viu John Casper em todo aquele
tamanho, tocando um delicado violino e sorriu. Depois viu Janaira, acenando
maluca para ela. Só faltava ela na mesa dos Agentes Especiais. “Ah, droga!”,
pensou ela, apressando-se. Meio desastrada, Lex tropeçou no último andar dos
degraus do palco e cairia se não fosse salva por duas mãos hábeis em sua
cintura. Lex ficou corada ao se virar.
-
Está atrasada! – falou ele, seus olhos azuis fixos nela, repreendendo-a.
-
Eu tive muito trabalho hoje!
-
Eu ordenei que desse prioridade para a festa, menina!
-
Ah, Jack... sem sermão dessa vez, por favor... e pare de me chamar de menina!
Jack
a guiou até a mesa, com uma mão em suas costas. Era o suficiente para deixar
Lex nervosa. Já fazia um ano desde que haviam terminado e Lex ainda não
conseguia controlar o nervosismo na presença dele.
Ele
puxou a cadeira para que Lex se sentasse e sentou-se ao lado dela. Ao lado de
Lex, Janaira estava sentada e ao seu lado, Danielle. Do lado de Jack, estavam
Lanister, Bio, Melanie e Dantas que só tinha olhos para Janaira.
-
Achei que Daniel não viria! – falou Lex, para Janaira cujos olhos brilhavam.
-
Ele fez uma surpresa, filho da mãe. – disse a bela morena, mordiscando o lábio
inferior. – Acho que vai ser hoje a noite, Lex. Acho que eu estou pronta, você
não acha?
A
festa estava maravilhosa. As pessoas conversavam animadas e outras dançavam. O
jantar foi servido e era possível perceber que Babucha, a chefe das cozinheiras,
havia caprichado na comida. Quando todos já estavam satisfeitos, Jack se
levantou e a filarmônica parou. Havia milhões de pessoas naquele pavilhão e ainda
assim, todos se calaram. Era assim que Lex via Jack: um líder nato. Jack puxou um pequeno microfone e sua voz
reboou pelos alto-falantes da Cidadela:
-
Caros cidadãos da Cidadela, da Fortaleza, da Trevor & Associados e do
Casarão... – disse Jack, apontando para Steve e seu cão Bob que estava num
cantinho, perto de uma das colunas do pavilhão. – Eu agradeço a presença de
todos não só para comemorarmos a libertação da Cidadela, mas para comemorarmos
a nossa existência. A nossa continuidade. Apesar de tudo o que cada um aqui
presente passou, nós continuamos. Uma sábia pessoa uma vez me disse que a vida
é dura e é difícil e é um dia atrás do outro. Todos nós sofremos, perdemos
pessoas importantes em nossas vidas, mas, porque continuamos, encontramos
outras pessoas que se tornaram especiais em nossas vidas, pessoas que nos
fizeram continuar. Essa sociedade não é perfeita e não busca a perfeição,
porque somos humanos. Mas nós buscamos nos transformar como tais, buscando a
solidariedade, a colaboração, a fraternidade que foram esquecidas por pessoas
que só queriam o poder. Isso não pode mais acontecer. Porque há uma hierarquia,
não quer dizer que não somos iguais em essência. Todos nós temos uma tarefa, um
trabalho, somos igualmente importantes. E isso precisa estar sempre em nós,
naquilo que fazemos, naquilo que somos... Aproveitem, festejem, sejam felizes
porque vivemos, porque continuamos... porque somos livres...
O
pavilhão de eventos explodiu em palmas e a filarmônica recomeçou a tocar.
-
Gostou do discurso? – perguntou Jack, virando-se para Lex que não tinham
palavras. Ele havia tomado suas palavras e elas significavam muito para ela.
-
Obrigada, Jack... você me ajudou a continuar quando Lizzie... – ela não
conseguiu terminar pois sua voz havia ficado embargada.
Mesmo
antes de sua irmã falecer, Jack havia ficado do seu lado, no hospital,
aguardando enquanto Lex esperava uma notícia. Quando Melanie informou que
Lizzie não havia conseguido. Lex desabou no chão, chorando como nunca imaginou
que choraria. De alguma forma, ela sempre achou que continuava para proteger
sua irmã e agora que ela se fora, não havia mais sentido em viver. Ela tremia
em desespero e imaginava que jamais seria feliz novamente. Mas então, ele
estava lá. Jack a abraçou. Permaneceu com ela. Dormiu em seu quarto quando ela
teve pesadelos. Cuidou dela quando ela estava doente. Nunca atravessou os
limites que ela havia imposto. Nunca aproveitou-se de sua fragilidade naquele
momento de dor. Ele apenas ficou ali, como um bom amigo, mesmo sendo muito mais
do que um amigo.
Foi
Jack, Lanister e Janaira que ficaram ao seu lado. Deram-lhe forças e a vontade
para continuar. Em seu coração era grata por aquilo. Ela estava feliz hoje. Via
rostos felizes, música no ar, alegria como há muito não se via. Era possível
continuar...
-
Uma dança? – falou Jack, oferecendo a mão direita para ela, tomando-a de
surpresa.
-
D-dança...? – perguntou Lex, nervosa. – Eu não sei dançar.
-
Eu também não. Vamos...
Ainda
nervosa, Lex aceitou o convite de Jack que a conduziu para até o espaço onde os
outros estavam dançando. Nos primeiros passos, Lex percebeu que Jack sabia
muito bem dançar.
-
Mentiroso! – disse ela, com um sorriso tímido nos lábios.
-
Relaxe, Lex, deixe que eu te guie.
Jack
a guiava com maestria e muitos dos que observavam apontavam os dedos para eles
e sorriam: era o chefe da Cidadela e a chefe de segurança juntos. Agora, a
história de ambos era de conhecimento geral.
Mas Lex não ligava para ninguém. Simplesmente não conseguia desviar
daqueles olhos azuis tão enigmáticos.
-
Sabe... eu fiquei apavorada a primeira vez que olhei nesses olhos. – disse Lex,
tornando a distância entre seus corpos cada vez menor. Jack é claro percebia.
-
Ainda te deixo apavorada? – disse ele, descendo as mãos das suas costas para a
sua cintura, pressionando-a levemente, trazendo-a mais para perto de si. A
canção ia num ritmo diferente do deles. Eles deslizavam em câmera lenta, leves
como plumas, embora houvesse uma grande tensão no ar. Naquela noite, ambos eram
pássaros dourados. Sem conseguir resistir ao magnetismo dos olhos de Jack, Lex
entreabriu os lábios e sussurrou em seu ouvido:
-
Eu quero mergulhar nesses olhos... quero me banhar nesse azul... eu quero
segurar seus cabelos contra minhas mãos... quero sentir o seu calor contra o
meu...
Lex
estava chocada. De onde vieram aquelas palavras? E, no entanto, ela não
conseguia desviar os olhos. Era a hora de sair correndo. Quebrar o encanto,
romper o clima. Por que não conseguia sair dos braços de Jack? O que a prendia
ali?
-
E por que não faz isso? – perguntou ele, se aproximando. Tornando a distância
de seus lábios inexistentes. O tempo parou. Sentiu seu sabor não em seus
lábios, mas em seu ser, na sua alma. Milhões de pessoas ao redor e o universo
parecia ter se reduzido a apenas aos dois. Já haviam se beijado antes, mas
aquilo era diferente. Era um beijo de saudade, de ansiedade. Dias e dias de
espera. E Jack a provocava. Era doce e suave em um segundo e passional noutro
instante – Desculpe, querida, por isso. – disse ele, afastando seus lábios dos
dela. - Não resisti. Eu precisa te beijar: você está linda e graciosa neste
vestido.
Lex
sorriu.
-
Você também não está mal nesse terno tão alinhado. – disse ela, apertando um
pouco a gravata de Jack em seu pescoço. – quem diria que nós dois iríamos
vestir roupas de gente normal.
Jack
sorriu também.
-
Sabe, Lex, eu jurei pra mim mesmo que seria paciente dessa vez. Eu jurei que
lhe daria todo o tempo do mundo. Fiquei de longe observando esse tempo todo. Eu
até pensei que poderia te deixar ir. Vejo você sempre com Abril e sei que ele é
jovem, tem a sua idade, é um rapaz ideal pra você. Se eu fosse um homem
decente, ficaria afastado para sempre, dar um pouco de espaço para ele
conquistar seu coração... mas eu não consigo, Lex.
-
Abril? – Lex perguntou, com um sorriso nos lábios, e envolveu os braços no
pescoço dele. – Abril é apaixonado por Melanie, Jack. Ela está grávida e eles
vão se casar quando o bebe nascer.
-
Eu achei que você e ele...
-
Ele é meu amigo. É meu braço direito, sabe, mas ele adora a Melanie. E pra
falar a verdade, eu tenho mais motivos para sentir ciúmes de você e Danielle do
que você de mim e Abril.
-
Acho que não! – falou Jack, divertido – Danielle tem uma queda por
mulheres. Ela namora a Madalena, a
arquiteta que construiu as casas residenciais e a muralha externa da Cidadela.
-
Jura? Como somos bobos então! – disse Lex encarando Jack. – Eu sei que eu tenho
estado afastada de você. Tenho sido arredia. Mas eu precisava saber, precisava
entender o que havia entre nós dois. Eu queria saber se eu era pra você mais do
que apenas uma cura.
-
E agora você sabe? – perguntou ele, franzindo o cenho. Ele parecia aborrecido.
Lex não queria aborrecê-lo, não queria fazer nada que pudesse estragar aquela
noite, mas precisava resolver aqueles conflitos. – Você acredita tão fielmente
na minha palavra quando eu lhe dou uma ordem na condição de líder. Você confia
em mim, luta ao meu lado, salva-me. Por que não acredita na minha palavra como
um homem apaixonado, Alexia?
-
Você diz que quer ser paciente, então tenha paciência comigo. Eu estou
aprendendo a amar, Jack. Você sabe minha história, sabe que Brandon criou em
meu coração algumas cicatrizes. É difícil pra mim confiar... mas eu confio em
você. Eu confio! É que tem acontecido tanta coisa...
-
Sempre acontece, Lex... – disse Jack, puxando Lex para mais perto. Ela colocou
sua bochecha contra o peito dele, sentindo os braços dele a envolverem como
quem envolve um bebê ou um tesouro precioso ao mesmo tempo que escutava seus
batimentos cardíacos. – Você sabe o que eu sinto por você. Sabe o quanto eu a
amo. Mas não vou me aproximar mais a não ser que você permita. Por favor,
permita!! – acrescentou ele com aquela voz suave que só ele conseguia fazer.
Lex
ergueu a cabeça para olhar naqueles olhos azuis...
Ergueu
a mão e enfiou os dedos naqueles cabelos negros, sedosos, brilhantes...
Jack
e ela eram iguais. Se ela tinha cicatrizes, ele também as tinha. Se ela
sofrera, ele também. Se ela lutara, ele também. Eram pássaros negros. Mas até
os pássaros negros podem amar, não podem?
-
Eu também amo você, Jack. – disse Lex, novamente. Ela ficou na ponta dos pés
para dar-lhe um beijo mas foi surpreendia com um abraço, sentiu a pequena
mãozinha envolvendo sua cintura e olhou para baixo para ver a carinha de Cindy,
sorrindo.
-
Vocês estão juntos! – disse Cindy. - Eu vi vocês se beijando!
-
Você iria gostar disso, Cindy? – perguntou Lex, fazendo uma carícia nos
cachinhos da menina.
-
Acho que já está na hora de você ir dormir, mocinha! – falou Jack, com um tom
amoroso em sua voz suave.
-
Ah, pai... só mais um pouquinho. Se vocês ir na frente, a tia Danielle me leva
depois...
Jack
olhou para Danielle que estava ali perto e ela estava de mãos dadas com
Madalena.
-
Eu levo ela depois... – falou Danielle, olhando para Lex, entendendo tudo.
Então
Jack olhou mais uma vez para Lex. Eram pássaros. Não precisam de palavras para
se comunicar. Seus olhares carregavam mensagens que só os dois poderiam
decifrar. Ele sabia. Ela sabia. Pertenciam um ao outro. Eternamente. Vivos....
ou
mortos.
Um
pássaro negro sobrevoa a Capital. Nenhum pássaro se vê no céu além dele. Os
pássaros agora não gostam daquele cheiro. Aquele cheiro ocre de remédio e
química que humanos espalharam por todos os espaços. Mas aquele pássaro era
diferente. Repelentes não lhe afetavam.
Ele
nascera de outro pássaro infectado. Ele fora uma aberração desde o nascimento.
O ovo partiu-se no corpo da ave mãe e ela fora devorada pelo filhote faminto de
carne. Qualquer carne: viva ou morta! Ele aprendeu a voar, a atacar outros
pássaros, a atacar coisas mortas. Ele aprendeu a tolerar o cheiro do repelente
e a distinguir diferentes cheiros. Agora estava em busca de algo diferente. Entrou
no deserto a procura do que lhe apetecia o olfato. Aquele cheiro tinha um sabor
especial e o pássaro negro o buscava: era cheiro de sangue. Não coagulado,
pútrido, mas sangue vivo e vibrante correndo a uma velocidade absurda nas veias
da criatura lá embaixo. Era uma mulher. Ela estava muito acima do peso e corria
para ir a festa no Pavilhão de Eventos da Cidadela. Hipnotizado por aquele cheiro,
o pássaro negro fez um rasante e atacou. Com o susto, a mulher caiu de joelhos,
ralando a perna. Tentando reagir rápido, bateu com a mão na ave, mas esta já
lhe havia arrancado um pedaço de pele e carne e retomou seu voo feliz.
O
sabor era indescritível. A ave comeu o pedaço como se fosse o próprio néctar de
Zeus. Segundos depois a criatura fez seu último rasante para o chão. O sangue
coagulou em seu estomago e levou-o a uma morte instantânea.
A
mulher atacada e confusa com o ataque súbito achou que poderia continuar. Não
era nada sério. E ela queria ir à festa. De repente, o cheiro das pessoas
concentradas naquele espaço parecia encantador. Não percebeu que nas suas
costas uma grande mancha roxa ganhava espaço. Ela não sabia, mas já havia
morrido.
Esta
é uma era estranha. Mortos vivem. Vivos morrem...
FIM?
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ESCRITO POR - ELIS VIANA
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ESCRITO POR - ELIS VIANA
DIREÇÃO DE ARTE -
MÁRCIO GABRIEL
DIREÇÃO - FÉLIX
REALIZAÇÃO - TV
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