quarta-feira, 30 de abril de 2014

A ERA DOS MORTOS - CAPÍTULO 50 (ÚLTIMO CAPÍTULO)


CAPÍTULO 50 - ÚLTIMO CAPÍTULO


Lex escutou uma ópera “desorquestrada” no interfone. Pessoas gritando. A voz de Jack implorando algo. Dantas e Janaira, mas não era possível descrever o que estava acontecendo. Pediu que Janaira lhe dissesse o que acontecia, mas Janaira também parecia estar na mesma condição que ela, confusa e sem saber o que pensar. Sentiu o chão tremer. Três vezes. Como se fossem explosões de algum lugar perto de onde ela estava, em seguida, viu detritos em chamas caindo pelo fosso da escadaria. 

Alguma coisa muito séria acontecia lá em cima.


Tomada de assalto pela possibilidade de perder aquela batalha pela qual dera a própria alma, Lex correu subindo os degraus de dois em dois. Segundos depois, Lex surgiu no 13º andar, abrindo as portas com estrondo e uma chuva de bala choveu sobre ela. Ela desviou do súbito ataque jogando-se no chão, mas uma das balas abriu um corte feio em sua têmpora direita e depois cravou na porta atrás de si.

Grudada no chão, Lex ergueu um pouco a cabeça para analisar a situação e viu Jack imediatamente. Ele estava atrás de uma mureta. Junto com ele estavam outros escravos.

Ela se arrastou para se aproximar dele e quanto estava perto o suficiente, ele a agarrou pelo colete e a puxou para si, envolvendo-a em seus braços.

- Achei que eu iria morrer sem vê-la uma última vez – disse ele em seus ouvidos. Lex se apoiou no peito de Jack e percebeu com medo que ele tinha uma ferida muito pior do que a dela na altura do coração.

- Oh, Jack! – disse ela, sentindo os olhos marejarem. – Você precisa de ajuda urgente!

- Acho que ainda vai demorar, amor! – falou Jack, parecendo mais cansado do que o normal.

Lex espiou por sobre a mureta. Apenas alguns segundos antes de outra chuva de balas ser lançada em sua direção.

- 20 agentes visíveis! – disse Lex.

- Abraham está escondido dentro de um quarto, maldito covarde! – falou Jack com uma certa dificuldade para respirar. – Há mais agentes lá dentro, não sei quantos.

Lex olhou para o peito de Jack, onde as granadas deveriam estar. Ele havia gastado as granadas que havia trazido. Isso explicava os estrondos e o estado daquele lugar. Fuligem negra e destruição para todo canto, para não falar dos pedaços de corpos espalhados pelo lugar como peças de decoração.

Então Lex olhou para o próprio colete, onde havia mais três granadas e seus olhos se estreitaram. Morte. Já havia feito muita coisa. Não poderia parar agora. Sentia seu coração palpitar diante da possibilidade. Morte. Era seu nome agora. Nem Paris, nem Lex, nem mesmo Alexia, que Jack gostava tanto de usar. Morte. Era o seu nome. Sempre fora o seu nome. Onde quer que ela fosse, no fim, era o que a definia. E agora que tudo se esclarecia em sua mente, Lex sabia o que fazer.

- Vamos mandar ao mesmo tempo! – disse Lex, entregando uma granada para  Jack e outra ao escravo assustado ao seu lado. Eles tiraram o pino e em sua contagem, jogaram do outro lado, abaixando-se.

O estrondo foi tão forte que a mureta se rachou. Era possível ouvir os gritos, sangue e mais pedaços de gente voando pela sala, encrustando-se às paredes, desenhando um novo espaço. Olharam para cima, uma nuvenzinha de poeira descia do teto rachado. Talvez fossem esmagados. Isso resolveria a situação. Dantas não falou nada sobre o 13º andar ter sido construído para conter bombas. Mas não era tempo para conjecturas, era tempo para ação.

Lex levantou-se imediatamente, sua mente limpa de qualquer racionalidade. Sacou a Beretta e começou a atirar cirurgicamente, atingindo cabeças e corações dos pobres malditos cujos torsos ainda persistiam em respirar.

O salão estava completamente destruído. E a força das três granadas abriram um enorme buraco na parede da sala onde Abraham se escondia. O espaço estava envolto em fumaça, não era possível ver muita coisa, mas mesmo assim, ela avançou.

Uma nova leva de balas procurou-a em meio a destruição, mas Lex era como aqueles pássaros negros que sobrevoavam a fortaleza. Ela desviou e na primeira oportunidade, atacou quem a atacava. Outro agente a atacou. Teria sorte mas Jack o atingiu no rosto. Jack estava no seu lado. Ele também era um pássaro negro a sobrevoar suas vítimas, fazendo rasantes, cheirando a morte. Ambos eram pássaros negros.

Aproximaram-se do buraco feito na parede, mas foram recebidos por novos tiros. Lex e Jack eram pássaros negros. Antes que alguém os atingissem, eles se abrigaram contra a parede. Cada um de um lado e ambos se encaravam. Não era preciso palavras. Eles sabiam que era o fim.  Era o fim. Nenhum pote no fim do arco-íris, a não ser o fim do próprio arco-íris. Era tudo o que eles desejavam. Era o prêmio que queriam.

Mudaram o pente de seus revolveres e colocaram novos. Era quase como se conseguissem ler o pensamento um do outro. Pássaros negros. Subindo em espiral, sem ninguém para lhes dizer o que fazer. Jack e Lex invadiram o recinto. Era grito, tiro, e rápidos movimentos para todo o lado. Lex tomou o lado da direita, Jack, o da esquerda. Lutaram e mataram. Impiedosamente. Os agentes berravam ao encontrar a morte, mas era uma morte rápida. Limpa. Eles ainda tinham suas armas e quando as balas acabaram, de um lado e de outro, as lutas corporais iniciaram, mas então já era tarde. Jack e Lex conviviam com o medo e aqueles agentes estavam confrontando o medo pela primeira vez. Não sabiam o que fazer com ele. Pássaros negros dando seus rasantes, fazendo suas vítimas.

Acabou em alguns minutos. Só restou Abraham ajoelhado, as palmas levantadas como se implorasse. Ele estava ferido. Uma bala no joelho, outra no braço, mas Jack e Lex também estavam acabados. Outras balas alojadas em outros pontos do corpo, mas algo os mantinha.  Talvez fosse a cura de Lanister, mas Lex sabia o que era: resistência. Jack e Lex eram iguais: eram guerreiros.



Lex se afastou. Entendia que Abraham era de Jack. Precisava ser, assim como Brandon fora seu, em seus últimos segundos de vida. Jack analisou-o por vários minutos, talvez imaginando qual o pior castigo de todos. Certamente, algo parecido com o que Lex fizeram com Brandon. Entretanto, Jack não quis estender o prazer de fazer Abraham sofrer. Ele tirou a faca do colete e com um só golpe, introduziu-a no topo da cabeça de Smith. O excêntrico velho soltou um grunhido, algo entre dor e prazer. Em seguida um fio vermelho desceu de sua testa e ele caiu morto no chão. 


Lex riria. Lex gargalharia até o fim dos tempos se Jack não tivesse tombado também segundos após Abraham.

- Jack? – gritou ela, correndo para ele. Ela colocou sua cabeça sobre seu colo, mas não sabia o que mais poderia fazer. Ele estava pálido. O esforço havia lhe tirado mais sangue de seu ferimento, ou poderia haver um outro ferimento, talvez mais perigoso, fatal. – Fique comigo, Jack!

- Alexia... – disse ele, com a voz embargada. – Você me fez muito feliz. No meio desse horror... nunca imaginei que poderia encontrar a felicidade novamente. Eu amo você, querida. Sei que não acredita em mim. Eu lhe dei razões para não acreditar em mim, mas eu não posso fingir pra mim mesmo. Eu queria me afastar de você e, entretanto, meu corpo procura o seu como eles tivessem sidos feitos um para o outro. 

Ambos habitavam lugares sombrios. Ambos navegavam durante a tempestade. Ambos encontravam a mesma coisa na troca de olhares. A paz serena de uma caverna no mar. A profundeza do precipício, diante da beleza única e inalcançável. Ambos se pertenciam. Ambos se completavam.
Era a verdade que ambos em algum ponto haviam rejeitado.

- Não me deixe – ela sussurrou rasgando parte de sua calça para fazer compressa sobre o ferimento de Jack. Estava ocupada demais com a tentativa de conter a hemorragia, quando sentiu os dedos de Jack sobre a sua mão.

- Alexia...

Lex parou e olhou para Jack que tinha o pescoço esticado para olhar para ela. Havia algo mais naqueles olhos azuis, e sabia o que era. Ele estava desistindo. Ele havia cumprido seu dever, seu papel de líder. Ele libertara sua preciosa fortaleza, libertara os escravos da Cidadela e agora pretendia ir embora. Talvez ele tivesse planejado isso o tempo todo. Ela sentiu os olhos arderem, a face corar, o sangue ferver como se tivesse sido atirada numa panela de pressão.

- Covarde idiota!!! – gritou ela para ele.

- Eu não mereço viver, Lex. Eu sou responsável pela morte de bilhões de pessoas porque eu falhei. Sou responsável pelas vidas que foram confiadas a mim. Eu sei que muitos foram recuperados pela cura de Lanister. E os que morreram, Lex? Eu mereço morrer. Eu mereço morrer e morri pela causa, Lex. Agora deixe-me ir... vá embora e deixe-me. Eu não quero que a última lembrança que você tenha de mim, seja a minha morte.

- E você, Senhor da Fortaleza... você sabe o que eu passei? Você sabe tudo o que fizeram comigo e o que eu fiz com os outros? Eu sou um monstro, Jack. Um maldito monstro que mal pode olhar pra si mesmo. Mas eu continuo. Eu continuo. A vida é assim. A vida é dura. É difícil e é todos os dias. Enfrentar uma hora após a outra. Eu te amei mais do que qualquer outra coisa e ainda assim repeli você, afastei a única coisa boa que aconteceu comigo para longe mim. Eu mereço viver? Mereço morrer, Jack? Eu continuo. Eu continuo... Você pode continuar também...

- Alexia... Estou tão cansado... – disse ele, a voz quase um sussurro.

- Por mim, Jack... Continue por mim senão por você... Assim como eu continuo por você! Jack... Jack...


Jack fechou os olhos. Quando seus cílios se tocaram, uma lágrima escorreu pela face coberta de fuligem, sangue e dor.

- Jack...?


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ESCRITO POR - ELIS VIANA
DIREÇÃO DE ARTE - MÁRCIO GABRIEL
DIREÇÃO - FÉLIX
REALIZAÇÃO - TV VIRTUAL
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