CAPÍTULO VINTE E CINCO
Ugo
dá alguns passos e chega a uma outra sala. Ela está escura, e apenas a luz de
uma lareira ilumina o local. A única coisa que se pode ver é a sombra de uma
pessoa tomando algo em uma taça. Parece vinho.
—
Cérebro?
— Espero que não tente nada contra mim. —
diz Cérebro.
— Por
que está no escuro? — pergunta Ugo.
—
Gosto das trevas.
A
pessoa em questão coloca a taça de vinho em cima de uma mesa e se levanta da
poltrona, ficando de costas.
—
Você tem uma semana para me trazer este documento aqui. Ou morrerá.
—
Sabe que io non tenho medo da morte,
Cérebro.
— Não
foi isso o que me pareceu. Não naquele quarto.
— Io vou fazer o possível, mas não garanto
nada. Terei de entrar na mansão dos Peregrini para pegar o documento.
— Não
quero saber como fará isso, Ugo. Já disse que o que me interessa é que a
porcaria deste papel esteja aqui comigo. O tempo está passando. Vá!
Ugo
sai do esconderijo de Cérebro em direção à Mansão Peregrini.
***
Suas
pernas estavam trêmulas. Quando Ugo observou a fachada da mansão, no exato
momento ele se lembrou de toda sua juventude, quando sofria nas mãos de Wagner.
Em 25 anos, era a primeira vez que ele passara tanto tempo longe daquele local.
Estava voltando, mas como um bandido, um clandestino, para pegar um documento
que poderia, talvez, lhe dar uma vida melhor. Mas só se Cérebro quisesse.
Decidiu
subir o portão dos fundos, onde lá estavam os cães de guarda. Ele pulou, e os
cachorros nada fizeram, pois quem cuidava deles era o próprio Ugo. Deu um
cafuné nos dois vira-latas e entrou na mansão pela cozinha.
—
Agora a mansão é toda minha. Finalmente encontrei uma patroa que dê valor a
minha eficiência. — diz Fidel, esticando-se no sofá e pegando o controle
remoto. — Dona Cida tem o meu respeito.
Ugo
passa pela sala sem problemas e sobe as escadas o mais rapidamente e o mais
silenciosamente possível.
Dona
Inês espana alguns móveis de um quarto, e Ugo passa por ela também, sem que ela
perceba. Sua próxima parada é o escritório de Wagner. Ugo puxa sua carteira do
bolso, e dela tira uma pequena chave. Com esta, ele abre a gaveta da mesa do
escritório e de lá puxa o documento.
—
Finalmente... O documento!
***
Na
sala de estar da mansão, Fidel continua assistindo TV. Ugo passa por ele despercebido,
e corre assustado quando o mordomo começa a gritar ao ver uma notícia no “TV
Fama”.
—
AAAAAAAI meu Deus, eu não acredito! Eu vou ter uma síncope. Inês, Inês! Me
acuda, please!
Inês
desce as escadas rapidamente, preocupada por achar que aquilo tudo fosse uma
coisa séria.
— Mas
o que foi, menino do céu?
—
Inês! Eu sabia. — Fidel aponta para a televisão, que mostra imagens de
Robervaldo, o ídolo de Fidel, um dos personagens de sua novela favorita.
— Mas
o que foi, Fidel. Fala logo!
—
Ele, o Robervaldo, mulher! Ele vai vir aqui na cidade dar uma entrevista! Eu
tenho que ir lá, dizer que eu peguei o nosso buquê no casamento da minha filha.
E a gente tem de se casar.
— Meu
Deus do céu! Eu pensei que fosse uma coisa séria!
— E
é. Sabe desde quando eu acompanho essa novela? Não? Desde sempre. Eu preciso
falar com ele. — Fidel se abana. — Eu vou acampar na frente daquela emissora só
pra falar com ele. — Fidel se levanta do sofá. — Fui!
— Mas
ele só vai vir no mês que vem!
—
Começo a arrumar a minha mochila pra acampar de hoje mesmo! — ele sai.
— Só
isso mesmo pra tirar essa criatura de cima do sofá. Jesus amado... — diz Inês,
apanhando os copos de cima da mesa de centro.
***
Dias Depois...
Música : Engenheiros do Hawaii – O Papa é Pop
Estamos no prédio da sede da revista Flash Magazine
em Fortaleza. Bruno e seu amigo Calebe tomam café em uma das salas.
—
Uma sala só pra mim, um salário gordo. Eu tô feito, Calebe!
—
Só não vá se esquecer dos amigos, senhor Bruno.
—
Parece que esse namoro com a Vanessa me serviu mais do que eu pensava, Calebe.
Tipo, eu só fiquei com ela pra entrar na mansão e filmar a leitura do
testamento. Mas acabei ganhando um cargo na revista que eu tanto almejava.
—
Mas... e a tal da Ingrid? Velho, a gente sabe que ela é a verdadeira filha do
Wagner, mas ela está se passando por Cida, torrando a grana do cara lá na
França. Ela está usando uma identidade falsa. Isso é crime.
—
É... Eu sei.
—
Você ainda gosta dela, não gosta?
—
Eu amo a Ingrid. Eu a amo muito. Mas eu preciso de grana, Calebe.
—
Por que vocês terminaram?
—
Ela me largou por que... Eu não a defendi quando o Ugo a agrediu. Mas eu não
tive reflexos na hora. O Ugo, aquele motorista e algumas coisas mais do
Wagner... Ele é um assassino, cara. Por isso ele sumiu. Eu sei de muita coisa.
Sei que a morte do Wagner foi encomendada. E acho que por alguém da família
dele.
—
E porque você não expõe tudo isso na mídia, Bruno?
—
Está louco? Olha onde eu tô? Olha aonde eu cheguei! Eu não vou arriscar minha
vida por isso. Mas eu vou deixar tudo guardado. Até as imagens da leitura do
testamento. Posso precisar um dia.
***
Ugo
entrega o documento para Cérebro. A sala está escura e apenas a luz de uma
lareira ilumina o local, como dito em outra ocasião.
—
Ótimo! Ótimo! Finalmente eu poderei me apossar da grana que é minha por
direito! — exclama Cérebro. Vemos apenas sua sombra.
—
Quando você irá se revelar, Cérebro?
—
Brevemente. Quando a catadora de lixo voltar de Paris. E aí, quando ela chegar
aqui, dará de cara com o novo proprietário das mansões, dos iates, jatinhos, da
grana, das ações... Tudo o que era do Wagner. E ela e a ralé dela voltarão para
o lixão!
Cérebro
dá uma gargalhada.
(ESPAÇO PARA A ABERTURA)
Música : Miley
Cyrus – Adore you
Paris – França.
Paris estava mais romântica aos olhos de
Ingrid e Victorio. Ele a tinha em seus braços e ela estava feliz por isso.
Finalmente era uma mulher completa: tinha dinheiro, posses, e um homem aos seus
pés.
Passeavam
de barco em um rio gelado da cidade, abraçados, e dando beijos ardentes. O
homem que pilotava o barco até ficou um pouco encabulado de tantos beijos que
Ingrid e Victorio davam, sem pudor, como se nunca mais fossem se encontrar,
como se aquele fosse o último dia de suas vidas.
—
É cedo para dizer que te amo? — diz ele, abraçando Ingrid.
—
Me abraça mais forte. Está frio. — Ingrid desconversa.
Mesmo
com todas as declarações de amor de Victorio, Bruno continuava sendo o
protagonista dos sonhos de Ingrid. O cafajeste, como ela mesma se referia a
ele, era o homem com quem ela realmente gostaria de estar. Dividida agora
Ingrid estava. E logo, quando voltasse ao Brasil, teria de se decidir se
realmente era com Victorio que ela gostaria de ficar, ou se deveria correr para
os braços do paparazzo Bruno, mesmo ele a traindo profundamente.
***
Música : Cansei de Ser Sexy – Dynamite.
Fidel
estava acampando do lado de fora da emissora onde era exibida sua novela. Além
dele, há alguns paparazzi, jornalistas e câmeras.
O
mordomo grita desesperadamente ao saber que finalmente seu ídolo acaba de
chegar. Ele segura um cartaz que diz: “ROBERVALDO,
MEU FILHO É TEU!”. O agora apresentador passa em sua limusine e acena para
Fidel. Ele é recebido com muitos flashes.
―
Ai, eu vou morrer! Eu vou morrer! – Fidel pula, chamando a atenção de todos a
sua volta — Ele acenou pra mim!
Fidel
se joga nos braços de alguém, fingindo um desmaio. Alguns segundos depois ele
se levanta e se dá conta de que pode invadir a emissora.
—
Preciso correr. Preciso falar com ele! Robervaaaaaaldoooo!
Fidel
corre para dentro da emissora antes que os portões se fechem. Os seguranças o
perseguem, mas ele consegue os despistar entrando em uma lata de lixo. Quando
os seguranças da emissora vão embora, Fidel sai.
—
Eca! Que fedor... Mesmo assim eu vou. Preciso dizer ao Robervaldo que eu peguei
o nosso buquê no casamento da minha filha.
E
coberto de lixo, Fidel sai à procura dos estúdios do jornal em que Robervaldo
dará entrevista.
O
mordomo dos Peregrini anda alguns metros até achar a limusine. Há um cercado
para que os paparazzi autorizados a entrar na emissora não ultrapassem o
limite, e um tapete vermelho para que Robervaldo faça um desfile triunfante até
chegar aos estúdios. Ao saber disso, Fidel corre, tentando chegar o mais perto
possível do cercado. Os fotógrafos e jornalistas se incomodam com o odor de
lixo do mordomo, o que facilita sua aproximação.
Enquanto
isso, Robervaldo sai de dentro da limusine. Deixa que o vento bata em seus
cabelos, que ficam esvoaçantes. Ele ajusta seus óculos escuros e dá uma alisada
básica nas suas madeixas com a mão direita. Com a esquerda, carrega uma bolsa.
Ele desfila pelo tapete vermelho, até que o seu momento “divando” é
interrompido por Fidel, que conseguiu pular o cercado e chegar até o tapete
vermelho.
—
Ai! O que é isso? Seguranças! Bombadões! Olá! Alguém? Socorro! Tem um louco me
atacando! — grita Robervaldo.
Fidel
abraça Robervaldo e resmunga algumas palavras:
—
Robervaldo, eu sou seu fã. — ele tira um CD da Madonna e uma caneta do bolso —
me dá um autógrafo. Assina o meu CD da Madonna, casa comigo!
—
Madonna? Seguranças, tirem essa ralé daqui, por favor! Sai pra lá, pobreza.
“Cê” tá fedendo a lixo, me poupe. CD da Madonna? Eu mereço... — Robervaldo se
recompõe e sai desfilando pelo tapete vermelho.
Fidel
fica decepcionado e os seguranças o tiram do local.
***
Meses
Depois...
Música : Miley
Cyrus – Adore You.
Fortaleza,
Março de 2013.
Os fortes ventos da terra do sol
batiam novamente no rosto de Ingrid e esvoaçavam seus novos cabelos, compridos
e loiros. Tinha um novo jeito de se vestir, de se portar, e até mesmo de andar.
De braços dados com o seu noivo, Victorio Machado, e acompanhada dos amigos,
Analú e Alex, ela desembarcou do seu jatinho particular no aeroporto
Internacional.
—
Enfim, estamos novamente em Fortaleza, minha querida Cida! — diz Victorio.
Ingrid
o observou, apenas. E com o nariz empinado, seguiu em direção ao carro que ali
estava a sua espera.
—
Para a mansão Peregrini.
“Agora
eu estou disposta a caçar Ugo e a tal pessoa que mandou matar meu pai”, pensava
ela. “Quero todos eles atrás das grades.”
***
Ugo
estava de volta à mansão Peregrini. Mas não como um vândalo, um intruso. Agora
como um proprietário. Tinha em mãos o documento que ele fizera Wagner assinar.
O documento falso, anulava o testamento em que Wagner deixava tudo para Ingrid
(Cida), deixando tudo para Cérebro.
—
Cérebro, estou na mansão. — dizia Ugo ao telefone, invadindo os portões em
companhia de uma advogada.
—
Isso mesmo. Tire toda essa ralé de dentro
da casa. Quero estar aí quando a catadora de lixo chegar. Quero tirar o doce de
dentro da boca dela. Já estou a caminho e estou levando a imprensa.
Fidel
e Inês são pegos de surpresa:
—
Não! Essa mansão aqui é da minha filha adotiva. Wagner deixou tudo pra ela em
testamento! — bradava Inês, depois de ficar sabendo que teria de deixar a
mansão.
—
Aquele testamento foi anulado. A senhora precisa sair da residência o mais
rápido possível. O novo dono já está a caminho.
—
E eu? — pergunta Fidel.
—
O senhor também. — diz Manuela Bonfim, a advogada. Ugo fica na porta principal,
de braços cruzados e gargalhando.
—
Ciao, bichona!
—
Eu tô sofrendo bullyng! — chora Fidel. Inês insiste para que ele a acompanhe em
direção à saída.
Tempos
depois, um grande carro preto para em frente à mansão. A imprensa é convidada a
entrar. Os paparazzi seguem para o salão principal.
—
Seja bem vindo, Cérebro! — grita Ugo. Cérebro ainda está dentro do carro com
vidros escuros.
Quem
será o Cérebro? O segredo será
desvendado no próximo capítulo. Não perca!