Já passava das nove da noite. Todos estavam sentados na sala. Miguel estava abraçado à namorada Angélica, enquanto Melissa observava tudo, sem tirar da cabeça o que ouvira de Eliana.
O casal de senhores prestava atenção
no fogo que estava na lareira, aquecendo-os.
– Por favor, Angélica. Conte-nos
direito: como ficou viva se você morreu? – Bruno soltou a voz, sem ter ao menos
uma noção do que aconteceu.
– Não gosto de falar sobre
isso, senhor Bruno. – Angélica ficou indignada. – Já disse muitas vezes.
– Pai, o senhor não entende? –
Miguel o encarou – A Angélica sofreu e não quer falar sobre isso.
– Vou me deitar. Com licença. –
Angélica se levantou apressadamente, e subiu as escadas. Miguel fitava o pai
com uma expressão nada agradável. A mão do rapaz fazia o mesmo, enquanto
Melissa continuava à espreita.
– Já falei mais de mil vezes, pai,
mais de mil vezes. O senhor parece que é surdo, não escuta. A Angélica não
gosta que falem do seu passado.
– Mas o que tem demais nesse
passado? Primeiro: você arranja uma namorada que é dada como morta e está viva.
Segundo: ainda quer que nós não fiquemos curiosos com a história dela. Por que
não arranjou pelo menos uma mulher viva de verdade, meu filho? Pelo amor... Eu
só sei que essa daí tá estranha demais pro meu gosto. Muito estranha. Você
devia tomar cuidado. Sinto que vem cheiro de coisa ruim.
Ela chorava incondicionalmente. Estava
muito indecisa. A vontade era de ter ido atrás daqueles que destruíram sua
vida, e voltar a ocupar seu lugar nos holofotes da fama, nos desfiles, nas
limusines pretas cercadas por fãs delirados. Lembrou-se dos muitos momentos em que
foi feliz: quando venceu o concurso de miss Brasil, quando ganhou o prêmio de
miss universo e quando atropelou Bruno, o responsável por ela estar ali,
pensativa.
– Oh, meu Deus. Ajude-me! O que eu
faço?
Ela
rolou na cama, sem imaginar que dentro de poucos minutos sua vida “poderia” correr
um grande risco. As mãos estavam suadas, e ela pôde se lembrar do passado, dos
erros que cometeu.
– Por que eu fui fazer aquilo? Onde
eu estava com a cabeça? – Ela se levantou da cama, e se olhou no espelho. – Até
quando você vai ficar com isso guardado, Angélica? Você tem que agir. – Ela
continuou se observando, e falando sozinha. – É isso que vou fazer: deixar de
ouvir os outros e agir.
Havia quatro homens
dentro do celta branco. Três eram negros, enquanto o único branco eram quem
dava as ordens. Parecia estar preocupado. Um dos homens sentado no banco de
trás fez uma pergunta, já que o veículo ainda não tinha saído do lugar.
– Tu tá tenso, Leandro?
– Cala a boca maldita, rapaz. Acha
mesmo que eu fico tenso? Eu sou macho. – Disse antes de dar a partida no
automóvel, que levava no bagageiro um belo conjunto de armas. Cada uma mais
perigosa que a outra. Estavam todas bem carregadas e prontas para matar.
As ruas estavam muito escuras. Eram
poucos os veículos que circulavam ali naquele momento. Um dos bons motivos para
continuarem. Pouco movimento pode ser sinal de sorte. Além de eles correrem um
menor risco de uma batida, por exemplo. O capim na beira das estradas balançava
com o vento. Era muito verde e alto. A muitos metros, já era possível enxergar
um farol. Os homens começaram a observar, tentando adivinhar qual era o tipo de
veículo. Chegaram à primeira certeza:
– Tem dois faróis. – O que dirigia
foi quem disse isto.
– E é um caminhão. – O do lado pode
concluir.
Mas
aquela curiosidade foi transformada de uma para a outra em pavor. O farol do
carro se apagou, e começaram a escutar muitas buzinadas.
– Desgraça!
O
motorista quase deixou o carro sair da estrada.
– Essa foi por pouco. – Concluiu um
dos homens de trás, aliviado.
Mas
nada havia acabado. Escutaram um grande barulho. Parecia que algum veículo
havia freado bruscamente. E foi exatamente isso: o caminhão que havia ter se
apagado de repente se chocou contra o veículo. Em questão de segundos, o carro
estava rolando pelos barrancos, e raspando seu teto no asfalto. Saiu muita
faísca. Enquanto o caminhão já se encontrava totalmente destruído no meio da
rua, com o motorista morto. Ao seu lado, várias garrafas de pinga apareciam. E
no automóvel, os quatro homens estavam de cabeça para baixo. Não era possível
saber quem estava vivo ou morto, pois todos estavam inconscientes.
Ela pensou em descer e voltar a
ficar com aqueles que permaneciam lá em baixo, mas algo tomou conta de si: a
curiosidade de conhecer o quarto de Melissa. Angélica estava parada na porta do
mesmo, pensando se deveria entrar ou não. Voltou a checar se alguém estava
olhando. Não estavam. Voltou e abriu a porta. Entrou.
Era um lugar neutro. As paredes eram
brancas e os móveis marrons. Um quarto digno de uma mulher encalhada, de uma
mulher que nunca foi desejada por nenhum homem. Começou a passar as mãos pelo
guarda-roupa de madeira. Era alto e antigo. Uma bela peça. Maldita a vez que
abriu uma das gavetas. Logo em seus olhos, uma imagem a penetrou: cerca de três
fotografias estavam estampadas por uma bela mulher loira, que estava indecisa
naquele momento. Ou simplesmente: a mulher da foto era ela.
– Desgraçada. E eu achando que você
era santinha. Tá na hora de me conhecer. – Ela pegou uma das fotos e pôde ter a
certeza de que era mesmo sua fotografia. – E o Miguel dizendo que eu podia
confiar na família dele.
Ela desceu as escadas bem devagar,
com o olhar fixo em uma única pessoa: Melissa. A última já se encontrava com os
batimentos cardíacos acelerados. Ninguém nunca olhara para ela daquela forma.
Mas os olhares maus foram desfeitos, e palavras foram jogadas.
– Vamos sair juntas amanhã, Melissa?
– O olhar de Angélica era brilhante e hipnotizante. Mas ela era a única que
sabia seu significado: armadilha.
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ESCRITO POR - WILLIAM ARAUJO
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