segunda-feira, 21 de julho de 2014

Duas Faces no Espelho - Capítulo 04



CAPÍTULO 04

Quando a limusine parou em frente à escola, Alis hesitou. Vestia um vestido elegante, mas não tão exagerado quanto o que sua irmã usara no dia anterior. Entretanto, alguns de seus alunos poderiam reconhecê-la. “Bem, se me reconhecerem, direi que sou Liz, irmã gêmea de Alis”, pensou Alis e estufando o peito para tomar coragem, saiu da limusine, cruzou o pátio dianteiro da escola, onde dois meninos brincavam e entrou na escola pelo corredor principal. Por sorte, estava completamente vazio. Nesse horário, os alunos e professores deveriam estar nas salas de aula.

Quando escutou um barulho de conversas atrás de si, apertou o passo e entrou em sua sala. Levou um susto. Sua irmã, vestida com uma saia curta que Alis nunca vira antes, estava lendo uma revista com os pés sobre a sua mesa.

- Liz?

Liz automaticamente desceu os pés e olhou incrédula para Alis.

- O que diabos você está fazendo aqui? – falou Liz num tom muito diferente do que ela usara durante todo o dia anterior.

- Bem... – Alis hesitou por uns segundos. – Eu vim destrocar com você. Não posso mais fingir ser alguém que não sou.

- Você não pode fazer isso... não agora! – falou Liz, retornando ao tom suplicante e suave. – Por favor, Alis. Você precisa me ajudar.

- Eu não posso fazer isso. E-e você... você mentiu pra mim. – falou Alis, morrendo por ter que enfrentar a irmã daquele jeito. Ela era o tipo de pessoa covarde, dizia a si mesma, não era capaz de enfrentar uma mosca sequer. – Sua amiga Lisa deu-me a entender que é você quem tem um caso e seu marido, que é muito assustador por sinal deu-me a entender que você não se interesse pelo próprio filho.

Liz ficou ali a observar Alis. De que maneira ela poderia enganar a irmã? Deveria ser alguma história triste que pudesse ludibriar a irmã tão tola e tão ingênua por um lado e idealizadora por outro.

- Você não sabe de nada, minha irmã... ah!, se soubesse! – falou Liz e fingiu lágrimas nos olhos. – Minha vida virou de ponta a pé desde que meu filhinho nasceu. Não sabe o quanto sinto ter me afastado do meu bebê, mas eu precisei, Alis. Deus me ajude, eu precisei me afastar do próprio filho...

A essa altura, Liz, que sempre tinha uma certa dificuldade em produzir lágrimas, cruzou os braços sobre a mesa e apoiou a cabeça sobre eles. Fingia soluçar e chorar e esperava estar convencendo Alis.

- Oh, por favor, pare de chorar, Liz. Por favor, eu peço desculpas por ter falado isso, mas você não havia me contado nada... sinto muito. – falou Alis, aproximando-se para fazer carinho nos cabelos sedosos e brilhantes de sua irmã – por favor, conte-me o que está acontecendo...

Liz fingiu enxugar lágrimas que não existiam e levantou um pouco a cabeça.

- A verdade é que eu tive um caso, sim. Com um homem terrível, um homem maldito. Ele me forçou, Alis. E ficou fazendo ameaças, dizendo que contaria tudo a Lucas. Por fim, concordei em manter um relacionamento com ele. Eu tenho crises terríveis de labirintite e fui a esse médico que é um brilhante otorrinolaringologista, o Dr. Dante, que se tornou o médico da família. Ele parecia ser bom e atencioso, no início, mas se tornou um homem abominável depois. O problema, Alis, é que fui ingênua demais. Engravidei e a dúvida consumiu a minha alma. Eu fiz o teste de DNA no meu bebê e tive a mais triste notícia de minha vida: o bebê não é de Lucas...

- Oh, meu Deus, Liz, porque não contou a Lucas desde o início...

- Ah, Alis... se você falou com meu marido, deve ter percebido que ele não é do tipo de homem que perdoa, nem que esquece. E é por isso que eu pedi para trocar com você. Meu casamento está acabado. Mas a verdade é que eu amo Lucas. Eu preciso de mais tempo. Eu preciso de tempo para pensar, porque se eu resolver dizer a Lucas, não haverá mais volta e se eu resolver não dizer nada a Lucas, então terei que continuar o meu caso com Dante e também não quero mais isso. Não percebe o quão difícil é a decisão que preciso tomar? Não percebe que depois dessa decisão, eu estarei para sempre presa numa situação indesejável de uma forma ou de outra?

- Sim, irmã... eu entendo. E compreendo. Eu mesmo casada a dez anos com um homem que me machuca constantemente, desejo ter coragem todos os dias para enfrentar essa situação, mas o medo é a pior coisa que existe no mundo. Eu gostaria de dizer que no seu lugar, diria a verdade a Lucas, mas se estivesse no seu lugar, eu também não saberia o que fazer. Está bem, Liz, eu continuarei no seu lugar até que tenha decidido.

- Oh, querida, você não sabe o quanto representa para mim. Eu precisava muito me afastar da minha vida, da minha família para tentar resolver tudo isso.

- Sim, sim, entendo, mas e o bebê? Por que se afastou dele? Pode não ser filho de Lucas, mas é seu filho...

- Alis, eu amo aquele bebê. Mas cada vez que me aproximava dele, eu via o fantasma de Dante nos traços do meu doce menino. Eu me afastei sangrando por dentro. Mas depois de eu voltar, depois de tiver enfim decidido, eu juro a você, que meu filho não sairá do meu lado. E vou dar todo o amor que não pude dar-lhe nesses seis meses da sua vida.

Alis suspirou e, enternecida pela situação da irmã, abraçou-a. Liz, às costas de Alis, teve vontade de rir. Enfim, convencera a irmã. Ela não precisaria saber a verdade, mas seria bom que Dante não cruzasse com ela. Não que não fosse parte verdade o que ela dissera. Dante era mesmo um homem terrível, mas era o homem da sua vida.

- Mas Liz, por favor, diga-me, como foi com Brade? – disse Alis, afastando-se de Liz.

- Dormiu como um anjo, não me incomodou a noite inteira. Não se preocupe, Alis. Posso lidar com Brade.

- Mas por quanto tempo? Quanto tempo mais devemos ficar trocadas? – Alis perguntou, ansiando pela resposta. Ansiando pelo dia em que deixaria de fingir para a família de Liz e pelo dia em que ambas poderiam enfim ficar juntas como irmãs.

- Uma semana... dê-me apenas uma semana...

Meia hora depois, Alis abriu a limusine e entrou no automóvel.

- Mudou de idéia? – perguntou Raul, visivelmente curioso.

- Minha irmã esclareceu algumas coisas. Vou continuar no seu papel por uma semana mais. Mas como soube que era eu e não Liz?

Raul sorriu e olhou para escola, sabendo que em algum lugar daquele prédio estava Liz. Ele era fiel a ela, sempre seria. Mas a verdade era que ele sabia coisas demais a respeito de sua empregadora para não distingui-la daquela pobre criatura que era Alis.

- Seu olhar, senhora... seu olhar é diferente...