CAPÍTULO 25
Dois meses depois...
Alguma coisa acontecia com o céu.
Primeiro, uma estranha brisa soprou forte, varrendo as folhas caídas. Depois,
nuvens carregadas preencheram o céu. Não eram quatro horas da tarde, mas
parecia noite. O problema foram os raios. Caíram silenciosos no início, como se
não estivessem ali. No entanto, todos prestaram atenção quando o céu foi
desenhado por eles. Cinco minutos depois, aquele som horroroso. Se houvesse um
Deus, talvez fosse Ele berrando.
As poucas mulheres responsáveis pela
lavação das roupas correram para retirar os trajes pendurados no varal e se
esconderam na fortaleza, preocupadas com a trovoada peculiar que tomava conta
do céu.
Jack e os outros agentes não podiam se
dar ao luxo de se esconderem. Os agentes mais fortes foram escalados para
ajudar na colocação de um teto de Eternit transparente sobre o pomar e as
plantações na ala oeste. Queria ter implantado aquele teto a mais tempo,
no mesmo dia que Alexia fora atacada por pássaros na muralha, mas precisou
aguardar os estudos de Bio, com esperanças de que as frutas e verduras não
fossem contaminadas.
Os homens que estavam sobre o teto
pararam de vez em quando para olhar para o céu. Era evidente em seus olhares o
medo.
Jack apenas supervisionava, parado,
observando tudo atentamente. Apreciava o céu naquele estado revoltoso e ainda
mais os raios e o som aterrorizador. Os homens olhavam para Jack assustados. O
chefe parecia tão assustador quanto o céu, com aquele olhar impassível.
Ninguém ousava se aproximar do chefe. Só depois de algum tempo é que Bio parou ao seu lado, parecendo esbaforido.
- Tenho uma boa notícia e uma má
notícia, chefe. Qual das duas você quer primeiro? – Bio perguntou, enquanto
recuperava o fôlego.
- Já estou farto de notícias ruins! – respondeu Jack simplesmente, num tom que parecia ser de outro mundo.
- O reagente funciona. Eu consigo identificar se a fruta ou verdura está contaminada ou não pelo vírus. Isso significa que não vamos ter 100% de perda na colheita.
- E a ruim? – perguntou Jack, imaginando que aquela notícia não era totalmente boa ao se utilizar palavras como ‘perda da colheita’.
- A notícia ruim é que somente um terço de toda a colheita, segundo as minhas estimativas, está livre de contaminação.
- E o teto transparente? Irá funcionar? – perguntou Jack, sem conseguir se afetar. Ele já sabia que grande parte dos alimentos estariam perdidos. A fome começava a ser um fantasma na fortaleza, mas estava preparado para aquilo. Com racionamento e algumas missões externas para coletar recursos poderiam manter toda a população da fortaleza até as próximas colheitas, pelo menos, a grande maioria dela.
- Deve conter um pouco, mas tudo deve
ser testado antes do consumo, inclusive os animais.
- Os animais?
- Perdemos os dez gados! Por sorte uma
das vacas está prenhe. Se for um macho poderemos recomeçar com ...
- E os frangos? - continuou Jack, sem
nem mesmo piscar.
- Os frangos estão bem. Os pássaros não conseguem entrar na granja.
- Os gados precisam de espaço e ar-livre. Não vai dar certo, vão acabar morrendo também. Contudo, vamos tentar. Se for um macho reprodutor, você irá mantê-lo, apenas para mantermos o número de vacas, que devem ser mantidas no celeiro. Há muitas crianças e dois bebês. Precisamos do leite, mas é melhor nos concentrarmos no que funciona. Avise Barbra para construir mais duas granjas.
- Certo, chefe!
Um novo raio e um novo estrondo despontaram no céu negro. Enquanto Bio se encolheu assustado, Jack simplesmente levantou levemente a cabeça para contemplar as nuvens.
- Você está estranho, chefe! Já faz
dois meses. Eu me sinto um pouco culpado, afinal, fui eu que achei a pasta que
incriminou a menina. Ela não tem caráter, chefe. Mas sei que deve ter sido
difícil...
Jack não respondeu. Estava concentrado
nas nuvens. Os primeiros pingos começaram a cair.
Lembrou-se do rosto de Alexia. Sentia falta dela. Era impossível não sentir. Ela era apenas uma menina para ele e, no entanto, não podia mais negar que ela o afetara. Desde que ela foi expulsa da fortaleza, não tinha uma só noite em que ele dormia sem pensar em como ela estaria. Estaria viva? Estaria ferida? Estaria morta?
A única coisa que ele sabia era que ela entrara com vida em um supermercado nos arredores de Parnaso. Estaria ela passando fome? As dúvidas o assolavam. Ele queria poder ir atrás dela. Queria poder arrancá-la daquele supermercado e mantê-la para sempre sob sua segurança. No entanto, não poderia fazer isso. Ele era o líder da fortaleza. Em seus ombros residiam as vidas de mais de quinhentas pessoas. Não poderia ser irresponsável. Não poderia agir impulsivamente. Virara um robô, sem vida, sem alma. A alma dele estava num supermercado, mas não poderia jamais compra-la de volta.
Condenara-se ao inferno e nem a chuva
que agora o molhava por inteiro poderia aliviar sua alma queimada nas chamas da
dúvida e do arrependimento.
ESCRITO POR - ELIS VIANA
DIREÇÃO DE ARTE - MÁRCIO GABRIEL
DIREÇÃO - FÉLIX
REALIZAÇÃO - TV VIRTUAL
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